quinta-feira, 4 de julho de 2013

DAQUI DESSA ESTRELA ONDE HABITO



Daqui, dessa estrelinha linda onde habito agora, olho pro mundo e não entendo mais nada.
Faz mais de um ano que parti da Terra, as coisas estavam aparentemente em ordem, tudo no lugar certo, havia uma certeza de estabilidade, de paz e de harmonia.
A minha mãe humana (essa que conta as minhas histórias) fazia meditação ouvindo Beethoven.
Era gostoso, eu ficava deitadinho nas almofadas, ressonando até ela acabar e vir me pegar no colo.
Vida mansa e boa.
Atualmente, quando vou em forma de estrela visitá-la, só a encontro agitada, aborrecida, com medo da vida.
Fala muito de um negócio que chama de política, a minha mãe não era assim, era calma e só falava baixinho, agora grita, gesticula...
Acho que essa tal de política deve ser doença dos nervos dos humanos.
Já tentei soprar no ouvidinho dela a ideia de procurar um médico, igual aos que ela me levava, sabe que ela nem consegue me ouvir?
Lembro muito das coisas boas,  cafuné nas orelhas, na barriga, o balanço do colo e as músicas que ela cantava quando eu ficava doente ou inquieto.
Contava histórias por ofício, quando não tinha criança ela não se apertava, contava pra mim, era muito legal...
Até hoje sei um montão de histórias bonitas.
Os vizinhos achavam que era esquisita, só porque conversava comigo o dia todo, pode isso?!
Eles é que eram esquisitos por não gostarem de conversar comigo, não me entendiam e ainda reclamavam que eu latia demais... Não eram latidos, seus bobos, era conversa fiada, au au...
Amanhã vou pedir pra ela  contar como virou minha mãe, e como eu era um nenem bonitinho e educado.
Se conseguir um passe pra visita e não estiver cansado, agora moro muito longe, au au pra vocês.

quarta-feira, 3 de julho de 2013

PRIMEIRAS LINHAS



Quando se nasce numa família pacífica a tendência é seguir a linha, eu não segui.
Fui sempre um rebelde latidor, desde os primeiros dias até os últimos.
Esse diário de peripécias é póstumo, não estou aqui mais para contar, e meu idioma
só meus pais entendiam, apesar de humanos.
O dia em que descobri que sabiam exatamente o que estava dizendo foi um susto e tanto,
gani desafinado, uivei em dó menor, usei todos os truques vocais disponíveis, e, ainda assim, eles repetiam com exatidão minhas lamúrias, e respondiam. E eu também os entendia!
Aí desencanei, aproveitei a sorte e fui feliz pra sempre.
Mais tarde acabei percebendo que não entendiam só a mim, um canino filho de dois humanos, falavam com os passarinhos que pousavam nas janelas também...
Depois foi um papo estranho que peguei eles levando com o gato do vizinho, pediam delicadamente para não se aproximar de mim, eu era muito, muito bravo.
Mentiram para proteger quem? Eu ou o gato? Até hoje não sei...
Bem, mas já não faz tanta diferença, pois estou morando nas estrelas e a minha mãe ficou responsável por refazer meus caminhos, contando, em ordem não cronológica, meus passos nesse mundão bonito.
Essa foi só uma rápida apresentação.
Amanhã ela conta mais um pouco, e não se assustem, eu sopro as histórias que ela não lembra mais nos ouvidos dela, afinal agora sou uma estrelinha voante.
Tão bom poder contar histórias com tradução simultânea cachorrês/português, au au .